- Priscilla Pereira
- 29 de jul.
- 4 min de leitura

Depressão e relacionamentos: por que é tão difícil se conectar quando estamos mal?
“A capacidade de estar só é a condição para a capacidade de amar.”— D. W. Winnicott
A depressão é muitas vezes descrita como um peso interno, uma névoa espessa que cobre tudo: o corpo, os pensamentos, os afetos. Para quem vive essa experiência, uma das dores mais difíceis é a sensação de estar desconectado dos outros, mesmo quando há amor, presença ou apoio por perto.
Se você já se pegou afastando pessoas queridas, sentindo-se irritado ou indiferente com quem você ama, ou vivendo uma solidão mesmo em meio à companhia... saiba que isso é mais comum — e mais humano — do que parece.
Neste artigo, vamos entender por que a depressão interfere tanto nos relacionamentos, o que isso revela emocionalmente e como a psicoterapia pode ajudar a restaurar os vínculos — inclusive o vínculo consigo mesmo.
🌀 Quando o outro se torna demais
Durante a depressão, o contato com o outro pode se tornar insuportável. Não por falta de amor, mas por um estado psíquico de retraimento e exaustão. Há uma necessidade interna de “desligar” do mundo para dar conta da dor que toma conta por dentro.
Pessoas deprimidas frequentemente relatam que:
“Não tenho energia nem pra mim, quanto mais para os outros.”
“Me irrito com facilidade, depois me sinto culpado(a).”
“Sinto que estou atrapalhando quem está perto.”
“Quero que me ajudem, mas não sei como receber ajuda.”
Essas experiências revelam um paradoxo da depressão: o desejo de ser acolhido e o impulso de se isolar. Uma parte quer proximidade, outra parte sente que não a merece.
💔 O impacto da depressão nos vínculos afetivos
A depressão afeta as relações em vários níveis:
1. Afetivo-emocional
A capacidade de sentir prazer, empatia ou gratidão pode diminuir — não por frieza, mas por uma espécie de “anestesia emocional”. O que antes gerava alegria, agora parece distante ou irrelevante.
2. Comunicacional
Fica difícil explicar o que se sente. Há medo de julgamento, sensação de que o outro não vai entender ou cansaço em tentar colocar em palavras algo que mal se compreende.
3. Comportamental
A pessoa pode evitar encontros, se irritar com interações simples ou se retrair diante do afeto. Isso pode gerar mal-entendidos e afastamentos, intensificando o ciclo da solidão.
Uma pesquisa da Organização Mundial da Saúde (OMS, 2023) aponta que a depressão é a principal causa de incapacidade no mundo e afeta não apenas o indivíduo, mas também sua rede de relações próximas. Segundo o estudo, 78% das pessoas com depressão severa relataram dificuldades significativas nos relacionamentos afetivos.
🧠 Por que isso acontece? Um olhar psicanalítico
Donald Winnicott, psicanalista britânico, nos ajuda a compreender a profundidade desse sofrimento. Segundo ele, quando uma pessoa não teve espaço suficiente para ser acolhida com autenticidade na infância, pode desenvolver um falso self — uma maneira de se mostrar ao mundo que não condiz com o que se sente por dentro.
Na depressão, esse falso self entra em colapso. A pessoa não consegue mais sustentar a imagem “funcional” de si mesma. E esse desamparo, ao invés de aproximar, pode fazer com que ela se recolha ainda mais. O vínculo com o outro, que deveria ser nutritivo, se torna ameaçador, justamente porque exige exposição, entrega e presença — algo difícil em momentos de fragilidade extrema.
Por isso, mais do que “dar conta” das relações, é preciso ter um espaço onde seja possível, primeiro, se reconectar consigo mesmo.
🌿 Como a psicoterapia pode ajudar?
A psicoterapia oferece exatamente isso: um espaço seguro onde você pode existir sem a obrigação de corresponder, agradar ou dar explicações.
Com o tempo e com o vínculo terapêutico, é possível:
Entender por que o afastamento acontece.
Reconhecer e validar as próprias emoções, sem culpa.
Resgatar partes do self que estavam silenciadas ou esquecidas.
Restaurar a capacidade de confiar, se expressar e se vincular com autenticidade.
Winnicott afirmava que a cura ocorre quando alguém encontra um ambiente suficientemente bom — onde pode ser quem é, sem ter que se defender o tempo todo. Esse ambiente, na psicoterapia, é construído pelo encontro entre o terapeuta e o paciente, numa relação que respeita os limites e sustenta as dores.
✨ Uma nova forma de se relacionar pode nascer
Reaprender a estar com o outro começa com estar consigo mesmo de forma mais inteira e cuidadosa. E isso não acontece de um dia para o outro. É um processo, um caminho de reconstrução.
A boa notícia é que não precisa ser feito sozinho(a).
💛 Um convite
Se você sente que os relacionamentos têm sido difíceis, se existe em você o desejo de se conectar — mas também o medo, o cansaço ou a culpa —, saiba que a psicoterapia pode ser um espaço de recomeço.
É possível reconstruir o vínculo com o outro. Mas, antes, é preciso cuidar do vínculo com você.
Se quiser, estou aqui para caminhar com você nesse processo. Vamos conversar?



